quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Duas almas

Hoje é um dia especial.

Pedro e Carol completam hoje sua segunda década de casamento. Estão todos ansiosos, Pedro preparou uma noite especial para sua amada mulher. A muito tempo eles não tem uma noite tranquila, sem os seus filhos para atrapalhar, Miguel de 17 anos e Ana de 8.

Tudo estava combinado, Miguel já era um rapazinho e iria tomar conta da casa e de sua irmãzinha. 

Carol está com um mau pressentimento, coisa de mãe. Ela quer avisar aos vizinhos que vão sair mas Pedro a acalma. Eles moram em um condomínio seguro e tranquilo, e como eles são novos na vizinhança não conhecem os vizinhos. Ela acata e se acalma.

No caminho o casal conversa animado. Pedro fazia suspense sobre o que tinha planejado para essa noite especial. Carol desiste de tentar descobrir a surpresa quando começa a tocar a música deles no rádio. Ela fica toda animada e acaricia o marido com amor. Eles estão felizes.

Carol começa a retocar a maquiagem e Pedro começa a observá-la. Como é linda, como a ama mesmo depois de tantos anos de casados. Ele fica encantado, sua mulher parece que emite uma luz própria.

Uma luz forte envolve o casal. Faróis vem em direção contrária e o consequente choque. Carol é arremessada pelo para-brisa seu corpo pousa ensanguentado no capô retorcido da pickup afrente. Pedro foi protegido pelo cinto de segurança, mas a colisão foi forte e fica dificil se manter consciente. 

Antes de apagar, Pedro observa o outro motorista. Um homem branco, de cabelos pretos e uma grande cicatriz cruzando o lado esquerdo do rosto. Aos poucos a vida deste indivíduo se esvai, e Pedro se entrega à inconsciência.

O casal está feliz conversando animadamente no carro. Pedro observa sua mulher, como ela é bela, como a ama mesmo depois de tantos de casamento. Carol para de se maquiar e diz "olhe para a estrada" Pedro parece hipnotizado e Carol grita diversas vezes "olhe para a estrada" e começa a chorar sangue.

Pedro preocupado limpa a face de sua amada, incrédulo. Olha para os seus dedos... sangue??? Quando ele vai perguntar para Carol ela está completamente ensanguentada e deformada. "OLHE PARA A ESTRADA".

Susto. Desorientação. Escuro. Onde estou? Parece um hospital...

Pedro, apesar de sobreviver, estava muito ferido. A colisão frontal foi em alta velocidade.

O médico faz algumas perguntas de rotina para garantir que não havia sequelas cerebrais ao paciente, visto que estava em boas condições chamou um estranho. Era um agente da policia que veio pegar esclarecimentos. Pedro não gostou muito, não queria conversar mas não teve muita escolha.

- O senhor se lembra do que aconteceu?
- Eu estava com a minha mulher no carro, tocou nossa música no rádio e não me lembro de mais nada.
- O senhor trafegou pela contra-mão, e na curva colidiu de frente com uma pickup que vinha no sentido contrário
- E minha mulher!!! ONDE ELA ESTA???
- ....

Pedro chora, se sentia culpado. Por que ela e não ele??

O policial continua:

- O senhor por acaso conhecia o homem do outro carro?
- Não! Como poderia conhecer??
- Ele era procurado pela polícia de 8 Estados...
- Eu... não me sinto bem...
- Entendo, me desculpe...

Assim que o policial fecha a porta Pedro cai no sono. Não se sabe por quanto tempo ele dormiu, quando acordou tarde da noite o quarto estava escuro e ele morria de sede. Tateou pela mesinha ao lado da cama tentando encontrar um copo quando ouve "procurando por isso?"

No canto do quarto um homem estava sentado, segurando o copo de forma delicada. Ele era muito elegante, vestido num justo terno preto, sua fisionomia não era muito visível pois as sombras cobriam seu rosto, mas dava para notar que sua tez era pálida.

O estranho se levantou e serviu Pedro que bebeu devagar e desconfiado tentando reconhecer aquele indivíduo.

- Pedro, Pedro... Você fodeu tudo não é mesmo?
- Como? Quem.... é você?
- Sua mulher está morta e por culpa de quem? (dá um tapinha no ombro machucado de Pedro)
- Saia daqui seu desgraçado, ou eu vou chamar a enfermeira!!

Pedro começa a apertar o botão para chamar a enfermeira ou alguém mas nada acontece. O homem ri, arranca da mão de Pedro o botão e o começa a apertar também e faz uma cara de deboche dando de ombros.

- Você amava sua mulher, Pedro?
- Mas é claro!! Eu faria tudo para salvá-la...
- BINGO!! Resposta certa!! E se eu te dissesse que há uma forma de salvá-la?
- Você é louco ou sádico?? Ela está morta! É claro que não....


Alguém toca a mão de Pedro. Quando ele olha não acredita em seus olhos. Era Carol sorrindo pra ele, linda e radiante! Pedro tenta perguntar algo ao estranho indivíduo, mas ele tinha sumido. Um aperto em sua mão. Não era Carol era aquele homem.

- Quem... Quem é você?

O estranho se aproxima um pouco, a luz parece fugir de seu rosto mas Pedro conseguiu notar os olhos estranhamente negros.

- Ah Pedro... Você é um cara inteligente, não faça perguntas que já sabe a resposta. Veja, eu posso trazer sua mulher de volta, e você ainda poderá salvar a vida daquele homem que morreu no acidente. Pense bem... Duas almas...
- Em troca do quê??
- Eheheh... Duas Almas....(resmunga alguma coisa...)
- Em troca do que????
- Isso é mero detalhe, você não precisa saber...

Pedro está atormentado, mas é a única chance de salvar sua amada. Redimir seu erro, tão pequeno, mas com consequências tão colossais... Ele estava disposto a dar sua alma ao demônio pelo seu amor! Ele não se importava mais consigo mesmo.

- Do que você precisa?
- Digamos que eu sou um cara... moderno. Relaxa, não precisa assinar um contrato em papiro com seu sangue isso é tão brega! (solta uma risada)
- E o que eu faço? Um beijo?
- Você não é meu tipo. E pare de assistir seriados! Eles são mentirosos!! (outra risadinha) Apenas diga "de acordo" e me de um entusiasmado aperto de mão. Imagine que sou um vendedor e você acabou de comprar o carro dos seus sonhos para viajar com sua esposa!! Ops.... (ele tava a boca de um modo debochado e gargalha novamente.)

Pedro estende a mão.
- De acordo...
- O que, eu não ouvi-iii... ANIMO!!
- DE ACORDO!

Apertaram as mãos.

Escuridão. Estrada. Música. Risada.

- Olha amor!! Nossa música está tocando no rádio!!

Pedro demora a se orientar. Ele está no carro. Sua mulher está retocando a maquiagem. Não é possível!! Deu certo!! Ela está viva!!

Carol pergunta à seu marido se está tudo bem, ele ficou estranho do nada. Aconteceu alguma coisa? Não meu amor! Diz ele com uma risada nervosa... Ele parece apreensivo, como se algo fosse acontecer...

Quando uma velha pickup vem na direção contrária, Pedro solta um suspiro nervoso e diminui a velocidade e parece que só volta a respirar quando o outro carro está longe. Ele encosta o carro.

- Você está bem Pedro? O que está acontecendo contigo
- Sim!! É que eu....você..... Eu te amo!!! Mudança de planos!
- Como? E a surpresa?
- Ah.. surpresa tive eu!! Vamos pra casa, eu vou cozinhar para você, a gente curte um pouco as crianças e depois tomamos um demorado banho de banheira.
- Mas você não queria...

Pedro a interrompe com um beijo lascivo e dá meia volta sorridente. Carol não entende nada mas estava gostando da animação do marido.

Chegando em casa Pedro é tomado de um mal pressentimento. Em frente à sua casa ele cruza novamente com aquela velha pickup. Eles passam devagar lado a lado. Pedro nota a grande cicatriz no rosto do homem. Definitivamente era o cara que ele tinha batido... O homem da pickup o encara com um olhar frio e vazio. Algo está errado.

Pedro estaciona o carro e desce correndo. A porta está aberta? Ele entra desesperado.

Carol ainda está entrando em casa quando ouve Pedro gritar em desespero do quarto de seus filhos.

***

O policial pergunta para Carol o que aconteceu, ela não sabe explicar. Ela está muito nervosa, chorando descontroladamente e não consegue falar direito. Mostram para ela uma foto de um homem branco, cabelos pretos e uma grande cicatriz cruzando o lado esquerdo do rosto.

Dois enfermeiros cochicham entre si
- Era esse o homem?
- Ela não viu. Só se lembrou de ter notado a cicatriz grotesca.
- Esse homem é procurado em vários estados. Ele é um serial killer cruel. Sempre tortura antes de matar. São tantas vítimas que já não se tem mais uma proporção de quantas vidas ele já tirou. Sempre crianças...

O policial se aproxima de Pedro.

- Desculpe senhor mas precisamos que...
- Duas almas por.... 
- O quê?
- Duas almas....

Pedro estava sentado na escada balançando e balbuciando baixinho. Quando o policial tocou em seu ombro ele diz com um riso estérico de quem entendeu uma piada macabra.
- Duas almas por duas almas...Duas almas por duas almas...Duas almas por duas almas!!!!

Um comentário:

  1. Seria eu que leio e entendo do assunto ou era meio obvio que isso iria acontecer?

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